segunda-feira, 20 de junho de 2011

O Euro do nosso descontentamento

João Ferreira do Amaral, um conceituado economista, professor do ISEG, veio hoje a público defender que Passos Coelho deve, desde já, começar a preparar, no maior secretismo possível, a saida de Portugal do Euro.

É verdade que em Economia não há certezas absolutas acerca daquilo que nunca aconteceu. Por outro lado, não vou dizer que esta proposta é um disparate por duas razões fundamentais: por um lado, aquilo que hoje pode parecer disparatado, pode amanhã ser a única e mais viável solução, por outro lado, o respeito e a reverência que tenho, sempre, pelos meus antigos professores leva-me a considerar esta proposta.

Antes de mais, em político “alto secretismo” é coisa que não existe. Não há nada que duas pessoas possam fazer sozinhas, logo, não há segredo possível. Mas, para além disso, penso, que, efectivamente, este não é o caminho. É verdade que o directório de Bruxelas e o eixo Paris-Berlim têm andado a ensaiar essa saída para a Grécia. Mas, não sei até que ponto é que alguém já conseguiu minimamente antever as consequências que isso acarretaria para toda a zona Euro. Mandar fora a Grécia não é a solução!

É verdade que para Portugal, perante o actual cenário, não há uma boa saída. Há uma saída menos má.

As alternativas são, no curto prazo:

  • continuar no Euro e ir perdendo competitividade no longo prazo, sofrendo, ainda por cima, na pele as medidas impostas pela Troika que, no imediato, são altamente recessivas.
  • abandonar a zona Euro e lançar o país numa crise de confiança tremenda, que arrastaria o país, no imediato, para uma situação próxima da bancarrota. É certo que a média longo prazo o país recuperaria alguma competitividade porque poderia desvalorizar a sua moeda e, por outro lado, poderia cobrir os défices orçamentais com emissão de moeda. Mas, como dizia Keynes, “no longo prazo estaremos todos mortos”

De facto, a impossibilidade de emitir moeda, conjugada com o facto de não se poder recorrer às chamadas desvalorizações competitivas, tem trazido a Portugal grandes dificuldades pois foram, no passado, dois instrumentos importantíssimos na política monetária nacional.

Ao aderirmos ao Euro perdemos essas ferramentas.

Mas a perda de competitividade não é uma fatalidade irreversível.

É estranho que ninguém fale da sobrevalorização ou sobreapreciação do Euro face ao Dólar. Essa é a verdadeira questão. A Europa perdeu competitividade porque construiu uma moeda que é demasiado forte para as regiões menos competitivas. Ora, se é sabido que, antes da adesão ao Euro, Portugal, Espanha, Grécia, Itália recorriam a desvalorizações das suas moedas para manter alguma competitividade, de que é que estavam à espera? Seria possível essas economias aguentarem sem dificuldades, sem sofrimento, uma moeda tão forte como Euro? E, já agora, pergunto: será que o nosso problema é assim tão diferente do da Alemanha de Leste? Recordo que durante anos a fio a Alemanha de Leste, já depois de integrada na Federação Alemã, recebeu transferências anuais na ordem dos 100 mil milhões de Euro – para que se tenha uma ideia, o conjunto de Fundos Comunitários do QREN para 2007-2013 é de apenas 21 mil milhões de Euro, para os sete anos (3 mil milhões por ano) – sem que isso tenha modificado substancialmente a competitividade daquela região. A análise dos dados ao nível de NUT's II comprova-o. Mas como é a Alemanha, ninguém fala!

Aproveito também para desmistificar a ideia de que “no tempo de Cavaco Silva foi um regabofe de Fundos Comunitários”. Falando verdade, nessa altura, o Pacote Delors II garantia para Portugal 700 milhões de Contos ao ano, o equivalente a 3,5 mil milhões de Euro ano, ou seja, menos 500 milhões de Euro por ano do que agora. É verdade que 3€ hoje valem menos que 3,5€ há quinze anos. Mas as taxas de juro hoje são muito mais baixas e naquela altura as infra-estruturas viárias, da educação e hospitais eram pagas sem recurso a PPP's.

Voltando ao tema, o que tem que ser discutido a fundo é: quando é que o Banco Central Europeu vai aceder a desvalorizar o Euro? Quantos mais postos de trabalho é que têm que ser destruídos? Quantos países europeus é que têm de entrar em bancarrota? Esta é a questão.

É verdade que um Euro valorizado em face do Dólar contribui para sustentar os preços dos combustíveis (medidos em USD) e nos dá a nós, Europeus, a sensação de sermos ricos quando vamos de férias à América, mas é tudo uma pura ilusão.

Ontém, Marcelo Rebelo de Sousa dizia que, com tantas pastas, Álvaro Santos Pereira, o novo Ministro da Economia passaría a vida em Bruxelas nas reuniões do Conselho Europeu, portanto, o melhor é mandar os Secretários de Estado às reuniões temáticas (Economia, Inovação, Comércio, Turismo, Transportes, Obras Públicas, Habitação, Comunicações, Emprego,...). Eu discordo. Álvaro Santos Pereira tem mesmo que passar os seus dias em Bruxelas, a bater o pé aos Eurocratas. Se ele disser com toda a eloquência aquilo que, ao longo de anos, tem vindo a escrever no seu Blog “Desmitos”, ele vai confrontar seriamente os seus homólogos europeus com questões sobre as quais eles nem sequer se têm debruçado.

Fica, pois, a minha esperança em alguém que, claramente, sabe fazer o trabalho de casa.

Em breve, trarei a este blog um tema que, para mal dos nossos pecados, tem andado arredado da agenda europeia: a harmonização fiscal!